O primeiro povo germânico a abraçar o cristianismo
em massa foram os visigodos, que habitavam nas margens do Danúbio e ao longo da
margem ocidental do Mar Negro. Essa conversão tomou maior impulso quando o godo
Úlfilas começou a trabalhar como missionário no meio dos seus conterrâneos,
tendo feito isso durante mais de quarenta anos. Úlfilas (311-383) foi
consagrado “bispo na terra dos godos” por Eusébio de Nicomédia, um bispo ariano,
em meados do século IV. Foi Úlfilas o tradutor da Bíblia na língua dos godos.
Ocorrendo uma perseguição, ele fugiu, com grande multidão, para além do Danúbio
e buscou proteção em Constantinopla. A adesão à ortodoxia cristã romana do
grupo somente aconteceu no final do século VI.
Outro fato marcante na evangelização dos bárbaros
foi a conversão e batismo de Clóvis (466-511). “Se me
concederes a vitória, crerei em ti e me farei batizar”, havia sido a promessa
de Clóvis a Jesus Cristo nos campos de batalha de Toul. De uma forma
semelhante ao que havia sucedido antes a Constantino, havia em Clóvis uma certa
barganha política com Deus para que ele se tornasse cristão. Como foi vencedor
no campo de batalha, Clóvis procurou aprender a doutrina cristã; a tradição
relata ainda a realização de um milagre, a cura de um cego durante o percurso
do séquito real de Clóvis até a cidade de Reims. Conforme outros povos
bárbaros, o rei era admirado e seguido pelos súditos, que aceitaram abandonar
seus deuses pagãos e reconhecer por Senhor ao Deus eterno aceito por Clóvis. O
rei foi batizado durante a Festa de Natal do ano 496, na catedral de Reims. Gregório
de Tours, o primeiro biógrafo de Clóvis, informou sobre o evento: “Chegando ao limiar do batistério, onde os
bispos reunidos para a circunstância tinham se postado para se juntar ao
cortejo, foi o rei que, tomando por primeiro a palavra, pediu a São Remígio que
lhe conferisse o batismo.” Após o batismo real, seguiram-se os batismos dos
demais membros da comitiva. Acrescenta a tradição da Igreja que, após essa
cerimônia, dar-se-ia a sagração do rei, ocasião na qual teve lugar um outro prodígio:
surgiu uma pomba trazendo no bico uma ampola com óleo, com o qual Clóvis foi
sagrado. Esse fato marcou o início do Catolicismo Romano entre os francos, os
atuais franceses.
Winfrid era um inglês nascido no ano de 680 em Wessex, filho
de pais cristãos, que adotou o nome latino Bonifácio com seu envolvimento na
obra de evangelização. Com sua grande capacidade de aprendizado e liderança,
poderia ter ficado na Inglaterra estudando, ensinando e talvez até mesmo
dirigindo um mosteiro, mas tinha seu coração voltado para missões, sentindo que
milhares de seus compatriotas saxões, nos Países Baixos e na Alemanha,
precisavam ouvir o Evangelho. Após uma primeira experiência fracassada, foi
para Roma, recebendo do papa um comissionamento missionário para ir além do rio
Reno e estabelecer a igreja romana entre os povos germânicos, onde não havia
ainda nenhuma atuação católica romana. Desde o século IV, as tribos germânicas
haviam aceitado uma forma de arianismo misturado com suas próprias
superstições. Missionários celtas haviam trabalhado na região sem continuidade
e existia em Roma o desejo de que o catolicismo se estabelecesse na região. Winfrid
trabalhou na Turíngia, na Frísia e em
Hesse. De volta a Roma, foi consagrado bispo, quando recebeu o nome de Bonifácio. Trabalhou junto a
Carlos Martelo, rei dos francos, cujo apoio foi importante para o missionário.
Confrontou-se com tradições religiosas germânicas, como no episódio da
derrubada da “árvore sagrada”, no qual a história e a lenda se misturam. Bonifácio
mobilizou vários missionários da Inglaterra, monges e freiras e, com a ajuda
deles, estabeleceu uma vigorosa organização eclesiástica por toda a região onde
atuou. Bonifácio morreu em 755, em Dackum, perto do rio Borne, em plena
atividade missionária. Acusado por alguns críticos de ter feito um
"trabalho missionário" basicamente político, fomentando a fidelidade
à igreja romana nas áreas onde ela era fraca, Bonifácio ajudou a lançar os
fundamentos do Sacro Império Romano-Germânico e as políticas do papado
medieval. Devido ao seu trabalho, a Alemanha se tornou uma fortaleza da igreja
romana até a época da Reforma. O historiador Kenneth Scott Latourette assim se
expressou sobre Bonifácio: "Ele era
humilde, a despeito das tentações que vieram com as altas posições
eclesiásticas; sempre se colocou muito acima dos rumores do escândalo; foi um
homem de oração e que tinha autoconfiança; assim como era corajoso, abnegado e
apaixonado pela justiça. Bonifácio foi um dos maiores exemplos de vida
cristã".
Na Morávia, região hoje pertencente à República Tcheca, os
irmãos Cirilo e Metódio, gregos da cidade de Tessalônica, ambos clérigos
dedicados, levaram a fé cristã aos eslavos e, durante o processo, ajudaram a
transformar e preservar a cultura daquele povo. Em 860, eles se uniram para
evangelizar a tribo cazar, a nordeste do mar Negro, atendendo a um apelo do
imperador de Constantinopla, para ajudar a conter a intromissão dos francos e
dos germanos sobre o povo eslavo.
Dedicando-se ao aprendizado da língua nativa e começando a traduzir as
Escrituras e a liturgia da igreja para o idioma eslavônico, Cirilo inventou um
novo alfabeto baseado nas letras gregas, o
qual se tornou a base para o alfabeto russo. Ainda hoje, o
"cirílico" é usado por alguns povos. Tendo lutado pelo uso da língua
da região no culto a Deus, em vez do latim imposto por Roma, Cirilo e Metódio
estabeleceram uma tradição cristã na Morávia e nos países vizinhos, fato que
alimentou e espalhou a fé por todo o povo.
Na Rússia,
embora o cristianismo já fosse conhecido desde a primeira parte do século X, a
fé não havia sido aceita de maneira geral pelo povo. Segundo lendas russas, o cristianismo chegou ao território dos atuais
estados da Bielorrússia, Rússia e Ucrânia pelas mãos de André, o apóstolo de Jesus. Colônias gregas no Ponto, na
Crimeia e na costa da Ucrânia permaneceram centros importantes do cristianismo
na Europa Oriental por quase mil anos. Mosteiros e mesmo
pretensas relíquias de Clemente, o quarto bispo de Roma,
existiram na região, além dos esforços de Cirilo e Metódio, que influenciaram o
cristianismo e a cultura do povos habitantes do lugar. Olga, princesa Kiev,
pediu ao rei germânico Oto I que enviasse missionários a seu país, onde ainda
prevalecia a religião pagã. Entre os pagãos estava Vladimir, seu neto, um homem
com muitas concubinas e esposas, além de mostrar em sua vida aspectos de
crueldade e falta de civilidade; ele era um amante da guerra, da caça e dos
festejos. Quando chegou ao trono, Vladimir queria manter seu povo alegre e governável,
pensando em unificá-lo para isso através da religião. Ele estava convencido de
que deveria adotar oficialmente uma das religiões existentes. Examinando as
principais religiões conhecidas, nem o islã, nem o judaísmo agradaram ao
príncipe, tendo ele de escolher entre o cristianismo romano e a igreja ortodoxa
oriental. Homens de Vladimir estiveram em Constantinopla, assistindo a um culto
católico ortodoxo, de onde voltaram impressionados com o esplendor e a beleza
ali encontrada, e afirmando: “Sabemos
apenas que Deus habita entre aqueles homens e que seu culto ultrapassa em muito
a adoração de todos os outros lugares”. A beleza da missa realizada em Haja
Sophia foi decisiva para que Vladimir optasse pela ortodoxia católica oriental.
Em 988, Vladimir casou-se com Ana, a irmã do imperador Basílio, de
Constantinopla, após ter sido batizado. Depois do batismo de Vladimir, o povo
colocou de lado as velhas religiões, aderindo ao catolicismo ortodoxo, que
continua forte naquela parte da Europa até hoje. Metódio e Cirilo foram
importantes para esse resultado, pois, graças a eles, a Rússia tinha uma
liturgia cristã no idioma eslavônico, sua própria língua. As pessoas puderam
então participar dos serviços religiosos e entender a liturgia nas belas
igrejas construídas por Vladimir e seus sucessores. A conversão de Vladimir
claramente influenciou seu estilo de vida, pois afirma a história que, ao se
casar com Ana, ele deixou as outras cinco esposas e demais concubinas, destruiu
também os ídolos pagãos, protegeu os oprimidos, criou escolas e igrejas e viveu
em paz com as nações vizinhas. Em seu leito de morte, doou todas as suas posses
aos pobres. Vladimir foi declarado santo pela igreja católica ortodoxa.
O
historiador presbiteriano Alderi
Souza de Matos lembra que nem sempre na história da igreja os grupos
imigrantes foram agentes da evangelização, mas às vezes foram objeto da mesma. Com
os grandes deslocamentos humanos em que consistiram as invasões bárbaras na
Europa dos séculos quarto e quinto, o que aconteceu foi a migração desses povos
da Ásia e da Europa Oriental para o rico Império Romano em busca de melhores
condições de vida. À medida que os bárbaros foram conquistando, também foram sendo
conquistados, tendo chegado como pagãos e se tornado cristãos. Além do
Arianismo, também os nestorianos na Ásia, durante muitos séculos, levaram a
mensagem de Cristo a muitos lugares inóspitos e longínquos que nunca haviam
sido atingidos pelo cristianismo majoritário, apesar de serem grupos marginalizados
pela igreja oficial e considerados heréticos, fato ocorrido também em outros
locais do Império com outros grupos.
Após
a queda de Roma e enquanto os bárbaros estavam sendo evangelizados, surgiu na
Ásia um movimento religioso em muitos pontos relacionado ao judaísmo e ao
cristianismo. Foi o nascimento de Maomé e o aparecimento do Islamismo, assunto
a ser estudado no próximo fascículo.
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