Bárbaro significa pessoa tida como não-civilizada. A palavra é frequentemente utilizada para se referir a um membro de uma determinada nação ou grupo étnico, geralmente uma sociedade tribal, vista por integrantes de uma civilização urbana e organizada como inferiores. Os gregos costumavam dizer: "Quem não é grego é um bárbaro", expressão talvez lembrada por Paulo e utilizada pelos romanos para se referir a todos os povos que não faziam parte do Império. Particularmente foram chamados de bárbaros os povos de origem germânica que, nas migrações dos povos primitivos, invadiram o Império Romano do Ocidente, causando sua queda no século V.
Os bárbaros, tidos como não-civilizados, brutos, cruéis, belicosos e insensíveis, começaram a invadir o Império Romano, que se considerava como o que existia na época de mais civilizado e evoluído. Quem eram os bárbaros? O termo era bastante abrangente, referindo-se a diferentes tribos, na parte oriental e na ocidental. De modo geral, os bárbaros se organizavam em clãs, desconheciam uma instituição estatal como a romana, suas leis eram baseadas na tradição, sendo transmitidas oralmente; além disso, dedicavam-se ao pastoreio e à agricultura. Eram povos guerreiros, o que garantiu a eles a fama de violentos e cruéis, apesar de os romanos utilizarem os mesmos expedientes contra os povos que dominavam.
Em A Cidade de Deus, Agostinho divide a sociedade em dois “partidos” opostos: A Cidade de Deus e a Cidade Terrena. Segundo suas palavras, “... ambas as Cidades enlaçam-se e confundem-se no século até que o juízo final as separe.” O texto pode ser considerado uma obra teológica e filosófica, na qual Agostinho tenta convencer os cristãos e os pagãos que a destruição do Império Romano fazia parte da vontade divina. Durante todo o contexto do livro, é possível prever o desfecho das duas cidades que divergem e se entrelaçam em si mesmas: a Babilônia terrena era o lugar do cativeiro, do presídio e do afastamento de Deus; a Jerusalém celestial era o lugar da vida em abundância, da libertação. Escrita entre 413 a 426, a obra é a interpretação do mundo romano da época à luz da fé cristã.
O segundo momento de invasão envolve, Leão foi sagrado bispo de Roma em 440. Na qualidade de supremo pastor da cidade, Leão foi bastante enérgico para a manutenção da disciplina na sua época, e muitos de seus sermões e decretos tinham esse objetivo. Um perigo iminente surgiu no horizonte: Átila, rei dos hunos, que a si mesmo chamava de “Flagelo de Deus”, destruía tudo nas Gálias e voltava-se para o norte da Itália. O imperador, o senado e o povo só viram uma saída para conjurar a situação: que Leão fosse parlamentar com o invasor. Para Leão, sua missão era clara: salvar o mundo cristão, e também sua pátria e seu povo. Mas a tarefa não era nada fácil, e o sucesso imprevisível. Após o encontro com o líder eclesiástico, Átila prometeu viver em paz com o império, mediante o recebimento de um tributo anual, fez cessar imediatamente as hostilidades e, pouco depois, fiel à sua palavra, retornou aos Alpes. A tradição da igreja católica mantém um relato segundo o qual o que fez o bárbaro recuar foi não somente a presença Leão, mas uma outra figura toda de branco com uma espada na mão ao seu lado, que teria sido vista por Átila; a tradição católica atribui a figura em questão a Pedro, havendo também aqueles que afirmam que Paulo também estava presente.
O Sumo Pontífice ordenou preces públicas para agradecer a Deus tamanho benefício, mas o povo, volúvel, logo se esqueceu do magnífico favor e se entregou às diversões, como jogos no circo, teatros e deboches. Apesar da pregação contra a decadência popular, sua advertência não foi atendida. Por isso, três anos depois, Leão já não foi tão bem sucedido com o vândalo Genserico. O que o Pontífice pôde obter dele foi que não queimasse a cidade e respeitasse a vida de seus cidadãos. E que estaria a salvo tudo o que se pudesse recolher nas três grandes basílicas de Roma. Mas Roma foi saqueada durante 15 dias, após os quais muitos ficaram na miséria. O Pontífice procurou socorrer os necessitados e reconstruir a cidade, declarando outra vez que esses males se deviam à impiedade do povo. Leão faleceu em 461. Bruce Shelley, em sua História da Igreja Cristã, considera Leão I como o primeiro papa católico romano, atuante numa época em que o poder eclesiástico começava a se confundir com o poder imperial.
O terceiro e definitivo momento de invasão aconteceu em 476, com os bárbaros hérulos de Odoacro, tendo havido a deposição do último imperador romano, Rômulo Augusto, que já era de descendência germânica. Odoacro reconheceu como único imperador romano o imperador do Oriente, sediado em Constantinopla. Durante as invasões anteriores, a população já havia abandonado as cidades, instalando-se na zona rural, em busca de proteção, desintegrando assim a conformação urbana que havia no Império Romano. Com a invasão, os bárbaros constituíram-se ainda inúmeros reinos no território antes controlado pelos romanos, iniciando o processo de configuração política que iria caracterizar a sociedade medieval.
Quais foram as causas da decadência do Império Romano, que resultaram nas invasões bárbaras do século V? Muitos foram os elementos que para isso contribuíram, podendo ser lembrados a ruína econômica de Roma, suas guerras civis, além da intensificação das rapinas de uma soldadesca cada vez mais barbarizada; podem ser citadas ainda as pragas de pestes que provocaram despovoação das cidades, as desordens internas, as revoltas sociais, a bandidagem terrestre e marítima, as lutas pelo poder entre exércitos bárbaros e representantes civis romanos, além da destruição das classes privilegiadas e o crescente domínio do campo sobre a cidade. As diversas tentativas de destruição de Roma atestam o enfraquecimento do poder imperial e o fortalecimento do poder político da Igreja, atuando tanto na área da administração política como na área espiritual. Isto se tornaria mais e mais evidente, à medida que os séculos se sucedessem.
E o que aconteceu com o relacionamento “igreja e povos bárbaros” a partir da miscigenação que começou a ocorrer a partir daquele momento? Vindo de culturas e religiões tão diferentes e variadas, qual foi a reação que os bárbaros tiveram diante do Cristianismo? Muitas foram as histórias, mas vamos conhecer algumas delas no próximo fascículo.
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