“Uma das forças de expansão do pentecostalismo está na sua habilidade em se adaptar e tomar emprestado”, diz A.H. Anderson, um estudioso do movimento. A partir dos acontecimentos da Rua Azusa narrados anteriormente, o movimento pentecostal espalhou-se pelos Estados Unidos e por todos os países cristãos do mundo, chegando também ao Brasil. Como o desenvolvimento tem sido multifacetado nos diferentes países, com surgimento de lideranças, tendências e igrejas muitas vezes com características locais, vamos nos ater aos acontecimentos no Brasil, abordando o que aconteceu e como chegamos à situação atual.
Segundo P. Frestron, outro estudioso do assunto, existem três períodos ou ondas distintas do pentecostalismo do Brasil. A Primeira Onda, o Período Clássico, entre 1910 e 1950, enfatizou principalmente o segundo batismo no Espírito Santo após a conversão, o falar em línguas e a restrição aos usos e costumes entre os membros das igrejas. A Assembleia de Deus e a Congregação Cristã no Brasil são as maiores denominações que surgiram nesse período e atualmente estão entre as maiores denominações evangélicas do país. Louis Francescon (fundador da Congregação Cristã no Brasil) e Daniel Berg e Gunnar Vingren (iniciadores da Assembleia de Deus) para cá vieram dos Estados Unidos, todos tendo sofrido influência da mesma igreja da Avenida Norte, de Chicago, dirigida por William H. Durham. Segundo pesquisadores do pentecostalismo, já estava presente na primeira onda a estratégia de crescimento pentecostal de fazer proselitismo entre os crentes das igrejas evangélicas em missões já existentes. Francescon iniciou sua atividade missionária pentecostal no bairro do Brás, em São Paulo, numa igreja presbiteriana, enquanto os suecos Berg e Vingren se filiaram à 1ª Igreja Batista de Belém, no Pará, fundada e dirigida por um pastor também sueco, Erik (Eurico) Nelson; em ambos os casos, a pregação carismática provocou saída de um grupo de membros das citadas igrejas para início de uma congregação pentecostal. Esse procedimento intensificou-se com a Segunda Onda.
A Segunda Onda, a partir da segunda metade do século XX, diferiu da primeira por fixar-se na cura divina, mostrando um forte interesse em demônios e exorcismos e continuando a restringir os usos e costumes dos membros das igrejas, na maioria dos casos. A Igreja do Evangelho Quadrangular (que iniciou como Cruzada Nacional de Evangelização, lançada no Brasil por Reymond Boatwright e Harold Williams, dois ex-atores de Hollywood), o Brasil para Cristo (de Manuel de Melo) e a Igreja Pentecostal Deus é Amor (de Davi Miranda) são os grupos mais relevantes nesse período, sendo a "Deus é Amor" um grupo legalista e faccioso. Sobre a Igreja do Evangelho Quadrangular, cabe ressaltar que, tendo como ênfase a cura divina e o exorcismo, milhares de evangélicos e curiosos foram atraídos aos seus cultos, por causa das canções de louvor com ritmos populares e mensagens de batismo no Espírito Santo, o que provocou divisões em quase todas as denominações pentecostais. O lema que serve de base à denominação, inclusive tendo inspirado o nome da Igreja voltado para os quatro lados de um quadrado (Jesus salva, batiza no Espírito Santo, cura e voltará) é chamado de “reducionismo doutrinário”, com sérias consequências teológicas, e mais tarde utilizado e aperfeiçoado pelo neo-pentecostalismo no Brasil.
A Terceira Onda, o atual neo-pentecostalismo , começou em 1977 com o início da Igreja Universal do Reino de Deus. A predecessora “Igreja de Nova Vida”, de Walter Robert Mcalister, lançou os fundamentos para a Universal e outros grupos neo-pentecostais ao introduzir alguns ensinamentos e métodos inovadores. Embora as igrejas neo-pentecostais mantenham algumas características em comum com seus antecessores das ondas anteriores, suas definições incluem a ênfase na teologia da prosperidade e na batalha espiritual, além do favorecimento da restrição dos usos e costumes dos crentes. O uso extensivo de canais de mídia, um modelo mais corporativo de organização denominacional e, em alguns grupos, agressividade para com religiões afro-brasileiras são outros traços das igrejas. A Universal (de Edir Macedo) e o “Show da Fé” (de Romildo Ribeiro Soares, cunhado de Macedo) são as duas maiores denominações deste período, embora outros grupos também tenham crescido expressivamente, como a Igreja Mundial do Poder de Deus, do missionário Valdemiro Santiago (dissidente da Universal), a Comunidade “Sara Nossa Terra” (criada por Robson Rodovalho em Goiânia), a Igreja Apostólica “Renascer em Cristo” (do casal Estevam e Sônia Hernandes). Além dos grupos citados, nomes como Rinaldo L. S. Pereira (da Bola de Neve), Valnice Milhomens Coelho (ex-missionária batista na África), Renê Terra Nova e outros atuam em grupos de terceira onda no Brasil, muitos ligados a lideranças equivalentes dos Estados Unidos, como Kenneth Hagin, Benny Hinn. C. Peter Wagner, Oral Roberts e outros, alguns dos líderes polêmicos e contestados.
O movimento neo-pentecostal brasileiro mostra semelhanças e interdependências com o pentecostalismo global e norte-americano, mas com características próprias, as quais têm promovido sua diversificação no cenário evangélico geral no Brasil. Falsos mestres, líderes que, juntamente com suas organizações, ensinamentos e práticas alteram o evangelho de maneira radical, têm dificultado às pessoas a compreensão da necessidade de salvação, não encontrando a mensagem do evangelho que realmente pode libertá-los. C. Butler afirma que a expansão do Reino de Deus está ligada atualmente tanto a um encontro com a verdade quanto a um encontro com o poder.
A igreja global precisa pensar de maneira crítica sobre a realidade cristã que resulta de movimentos transnacionais, como o neo-pentecostalismo. Verifica-se atualmente que a maioria cristã está mudando para o que é chamado de Global Sul (ou seja, nações da África, América Central, América Latina e parte da Ásia); antes considerados campos missionários, agora são pontos de referência para o cristianismo e estão enviando os seus próprios missionários transculturais. E preciso, no entanto, observar e analisar que tipo de missionário cristão está sendo enviado ao mundo e com que mensagem.
Segundo Isaltino Gomes Coelho Filho, já é possível se falar em baixo pentecostalismo, um tipo de neo-pentecostalismo onde as linhas entre o baixo espiritismo e neo-pentecostalismo foram apagadas. Práticas com o uso do sal grosso, sessões de descarrego e oferecimento de sabonete de arruda para espantar demônios estão muito mais para o baixo espiritismo do que para o evangelho. Quando o cristão, estando em um templo para onde foi buscar comunhão com Deus através de Jesus e com seus irmãos de fé, começa a questionar sobre o espírito que está presente dirigindo a reunião e fica com as dúvidas acima colocadas, é sinal de que algo precisa ser revisto na cristologia, na soterologia, na teologia, enfim, da igreja cristã do século XXI, assunto a ser abordado proximamente.