O Puritanismo foi um movimento de reforma religiosa surgido dentro da Igreja Anglicana na segunda metade do século XVI. Tinha como ênfase principal a preocupação com a pureza da igreja, do indivíduo e da sociedade e suas raízes podem ser encontradas no início da reforma inglesa. O nome “puritanos” foi dado pelos adversários do movimento, iniciado quando Henrique VIII repudiou a autoridade papal. Apesar da reforma iniciada pelo rei, a Igreja da Inglaterra manteve muito da liturgia e do ritual do catolicismo e as lentas mudanças deixavam muito a desejar.
Como a Henrique VIII não interessavam grandes reformas eclesiásticas, ao morrer, o rei deixou uma igreja que pouco diferia da católica, a não ser pelo fato de não obedecer mais a Roma. No reinado de Eduardo VI (1547-1553), com o apoio de dois regentes (já que o rei era menor de idade), outras mudanças aconteceram e foi introduzido o primeiro Livro de Orações em inglês. Sob Maria Tudor (1553-1558), porém, parte dos clérigos e dos protestantes foi executada e um grupo maior fugiu para o continente europeu, quando a rainha quis promover uma volta ao catolicismo romano. Em ambos os reinados, porém, o movimento puritano continuou a crescer.
O puritanismo se levantava contra a permanência de vestígios de tradição católica nas doutrinas e na liturgia, começando pelas vestes da autoridade episcopal. Além das vestes litúrgicas, os puritanos se opunham à guarda dos dias santos, à confissão de pecados ao sacerdote, ao sinal da cruz, à presença de padrinhos no batismo, ao ajoelhar-se na hora da ceia, além de outros elementos que faziam parte do que chamavam de “trapos do papismo”. Com o tempo, formaram-se três grupos dentro do movimento puritano: os episcopais, os presbiterianos e os congregacionais. Os puritanos episcopais não pretendiam sair da Igreja Anglicana, ambicionando uma abrangente reforma interna, que nunca aconteceu. Os presbiterianos, influenciados por Calvino, queriam na Inglaterra uma igreja com governo presbiteriano, semelhante à que se organizara na Escócia. Os puritanos congregacionais buscavam um governo mais democrático na igreja, no qual a congregação resolvesse seus próprios problemas, numa postura mais radical de influência anabatista. Robert Browne, teórico do último grupo, sustentava que os crentes deviam se unir a Cristo e uns aos outros por um pacto voluntário; que os ministros deviam ser escolhidos pelos membros; e que nenhuma congregação devia ter autoridade sobre a outra; opunha-se ele, portanto, ao relacionamento da Igreja com o Estado.
No campo religioso, com a morte de Maria e a coroação de Elizabeth, o grupo que fugira para o continente europeu voltou para a Inglaterra, após tomar contato e sofrer influência dos reformadores e de suas ideias, principalmente na Alemanha e na Suíça. Durante o reinado de Elizabeth I, uma aparente paz prevaleceu na vida religiosa inglesa, mas sob a superfície continuava uma luta sobre o tipo desejado de igreja. No aspecto econômico e social, a Inglaterra começava a era da industrialização, com grandes deslocamentos de pessoas do campo para a cidade, em um clima de instabilidade. Como as reformas introduzidas pela rainha tendiam a permanecer entre o catolicismo e o protestantismo, na chamada “onda média”, começaram a surgir entre os puritanos os separatistas, que formaram congregações independentes, sob a liderança de algum ministro anglicano, graduado em teologia, mas com tendências reformadoras. Como a igreja oficial da Inglaterra era a Anglicana, pressões e perseguições começaram a acontecer sobre os dissidentes, fato que levou muitos deles a fugirem da Inglaterra, buscando refúgio principalmente na Holanda. Uma dessas congregações formou-se na localidade de Scrooby, em Yorkshire, sob a liderança de John Robinson, a qual integraria a tripulação do navio Mayflower em 1620.
Os acontecimentos históricos envolvendo os puritanos se precipitaram. Em 1593, no reinado de Elisabeth I, foi aprovado o “Ato contra os Puritanos”. James I (1603-1625), sucessor dos Tudors e iniciador da dinastia dos Stuarts na Inglaterra, havia convivido com o presbiterianismo na Escócia, fato que encheu de esperanças os puritanos. Eles apresentaram ao rei a Petição Milenária, que foi totalmente rejeitada na Conferência de Hampton Court (1604), exceto a autorização para impressão de uma versão autorizada da Bíblia, a “King James version”. James afirmou que, sem bispos, não há rei.
A política de repressão contra os puritanos foi mantida no reinado de Carlos I (1625-1649), o que levou um grande grupo não-separatista a ir para Massachusetts na década de 1630. No final do seu reinado, o soberano entrou em guerra contra os presbiterianos escoceses e os puritanos ingleses. Estes eram maioria no Parlamento e convocaram a Assembleia de Westminster (1643-49), a qual elaborou importantes documentos da fé reformada. Oliver Cromwell foi o líder puritano das forças parlamentares que derrotaram o rei Carlos I, tendo se tornado “Lorde Protetor” da Inglaterra. Durante o Protetorado (1649-1658), a Igreja da Inglaterra foi inicialmente presbiteriana e depois congregacional. Todavia, as rivalidades religiosas levaram ao restabelecimento da monarquia sob Carlos II (1660-1685), que consolidou a Igreja Anglicana como episcopal e expulsou cerca mais de mil ministros puritanos da Igreja da Inglaterra em 1662, fato que marcou o fim do movimento puritano no país.
O pastor batista John Bunyan (1628-1688) foi um dos exemplos mais expressivos do puritanismo inglês na literatura. Sua obra mais importante, “O Peregrino”, de 1678, é o livro considerado como o mais vendido de todos os tempos abaixo da Bíblia. A obra é uma alegoria sobre a vida cristã, contando a história de Cristão, um peregrino atormentado pelo desejo de se ver livre do fardo pesado que carrega nas costas. Cristão segue sua jornada por um caminho estreito, indicado por Evangelista, partindo da Cidade da Destruição rumo à Cidade Celestial. No decorrer da aventura, ele se encontra com personagens de nomes alegóricos, tais como Hipocrisia, Boa-Vontade, Gigante Desespero, Adulação, Malícia, Vigilância e outros. Passa também por lugares sombrios, como o Desfiladeiro do Desespero, o Castelo das Dúvidas, o Pântano da Desconfiança, a Feira das Vaidades e o Rio da Morte. Durante a peregrinação, surgem várias adversidades e sofrimentos. Apesar de tudo, o protagonista mantém-se sempre sóbrio, encontrando auxílio em Fiel e em Esperançoso, companheiros de viagem.
“O Peregrino” simboliza a vida do cristão neste mundo, buscando não conformação, mas transformação do seu entendimento, no processo de santificação rumo à morada eterna com Deus. Representa na ficção muito do pensamento dos puritanos, que praticamente foram extintos na Inglaterra, mas que imigraram em grande numero para a Nova Inglaterra, na busca de melhores condições de vida material e espiritual, assunto a ser abordado oportunamente.
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