20 séculos de Igreja Cristã

20 séculos de Igreja Cristã
do século I ao século XXI

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

22. O LUTERANISMO

"Em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos”. (Atos 11.26b)

Iniciada em Jerusalém, a Igreja Cristã, assim chamada a partir de Antioquia, passou por diferentes fases e mudanças, até que acontecesse a Reforma Protestante. A partir de então, novos nomes surgiriam para congregações diferentes, sendo a primeira denominação aquela que deu sequência à obra do reformador inicial.
Foi de Lutero o seguinte pedido: “A primeira coisa que peço é que as pessoas não façam uso de meu nome e não se chamem luteranas, mas cristãs. Que é Lutero? O ensino não é meu. Nem fui crucificado por ninguém” (“Teologia dos reformadores”, de Timothy George, citando Lutero).
Embora não desejado pelo Reformador, com o desenrolar da história, os acontecimentos acabaram por desenvolver o Luteranismo. É inegável a contribuição de Lutero para isso, conforme já se abordou no fascículo anterior. Para os novos tempos, Lutero deixou obras importantes para a Alemanha e para a Igreja: os textos dos Catecismos Maior e Menor, a Bíblia na linguagem do povo, a composição de hinos, além das ideias de implantação de escolas públicas com educação elementar para o povo poder ler a Bíblia. Lutero defendeu alguns princípios básicos que viriam a caracterizar as convicções e práticas protestantes, como seus “Cinco Sola”, por exemplo: sola Scripturasola gratiasola fidesolus Christus, soli Deo gloria. Outro princípio aceito por todos os reformadores foi o do sacerdócio universal dos fieis.
Não há, porém, como falar de Luteranismo sem mencionar Felipe Melanchton (1497-1560). Antes de mais nada, Melanchton era um humanista: dominava e conhecia os clássicos gregos e latinos, tendo influenciado inclusive o próprio Lutero, apoiando-o com o seu grande conhecimento das duas línguas, além de suas ideias teológicas e da retórica. Ele foi professor em Wittenberg de 1518 a 1560; por ele passaram as grandes mentes e os líderes da igreja luterana inicial.
Com a  sua excomunhão em 1521 e  separação do catolicismo após a Dieta de Worms, Lutero não pôde participar da Dieta de Augsburgo, em 1530, através da qual Carlos V queria solucionar o cisma luterano. Melanchton, então, apareceu como a principal figura teológica no evento, quando os príncipes luteranos foram intimados a retornar à Igreja Católica Romana. Foi ele quem redigiu a Confissão de Fé apresentada diante do imperador e quem depois escreveu a defesa da Confissão, chamada de Apologia, como resposta à contestação da liderança católica. Com a morte de Lutero, em 1546, Melanchton naturalmente assumiu a liderança teológica do movimento luterano, embora muitos pontos de sua teologia fossem contestados.
A busca pela unidade exterior da Igreja Cristã sempre foi uma preocupação de Melanchton, embora tenha sido severamente criticado por parecer demonstrar inconstância com essa atitude. No relacionamento entre os luteranos e os demais segmentos cristãos, como os seguidores de Zuinglio e Calvino, incluindo-se aí também o catolicismo, Melanchton sempre procurou manter um tom conciliador. Havia nele um sincero desejo de expressar sua visão de catolicidade, num sentido amplo, dentro da Igreja. Isto fez com que ele buscasse corresponder-se com o Patriarca Católico Ortodoxo e mesmo com Henrique VIII, criador do Anglicanismo. Sobre ele, afirma Kolb: “Melanchton sabia que a igreja se estendia para além das fronteiras do seu pequeno pedaço da Alemanha. Esta percepção de Igreja como uma comunidade completa de Deus compelia-o a estender seu diálogo e preocupações além da Reforma Luterana...”
Em 1580, quando surgiu o Livro da Concórdia contendo os dogmas da Igreja Luterana, ficaram estabelecidos documentos e preces que explicam a fé luterana, incluindo a Confissão de Augsburgo, com as crenças básicas da igreja. São elas: 
  • A Bíblia como Palavra de Deus
  • Um só Deus, que se revela em três pessoas: Deus Pai, o Criador; Deus Filho, Jesus, o Salvador; e Deus Espírito Santo, o Santificador
  • O pecado como “transgressão” que nos afasta de Deus 
  • A salvação através de Jesus, o Filho de Deus que tira o pecado do mundo
  • O Batismo como sacramento, sendo praticado o pedobatismo, tanto através da imersão quanto da aspersão (forma mais usada)
  • A Santa Ceia, encarada como outro sacramento da igreja e considerada como “o verdadeiro corpo e sangue de Jesus, recebido em, com e sob o pão e o vinho”
  • A vida eterna com Deus como o maior bem almejado e garantido em Jesus.
A partir de 1531, com a formação da Liga de Schmalkald, os príncipes alemães que aderiram a Lutero levaram o movimento a grandes progressos, principalmente no norte da Alemanha. Com a assinatura da Paz de Augsburgo em 1555, cada príncipe ficou responsável pela escolha da religião oficial de suas possessões, dividindo a Alemanha em regiões luteranas e católicas. Pessoas que não concordassem com a decisão eclesiástica do dirigente deveriam se mudar da região. Tal como no catolicismo romano, continuou havendo no país a interdependência Governo e Igreja, não existindo ainda condições para se pensar em liberdade religiosa.
Em sua expansão pelo norte da Europa, na Suécia, o luteranismo tornou-se religião oficial em 1527, e na Finlândia, controlada pela Suécia, por volta do ano 1530, o luteranismo era a fé do povo e dos líderes. A Dinamarca, a partir de 1536, aboliu a religião católica e confiscou todas as propriedades romanas, tornando o luteranismo religião oficial em 1539. A Noruega, dominada pela Dinamarca até 1814, foi obrigada a aceitar as mudanças religiosas. Na Islândia, outra região de domínio dinamarquês até o século XX, o luteranismo foi adotado como religião oficial a partir de 1554. Em termos gerais, o luteranismo influenciou também a reforma de John Knox, na Escócia, e também o Anglicanismo na Inglaterra.
Hoje, no Portal da Igreja Luterana na internet, podem ser encontradas declarações de que “a comunhão de igrejas luteranas terá que colocar, necessariamente, no centro de seu trabalho, questões que envolvem injustiça, fome e pobreza”, conforme afirmou Margot Kaessmann, episcopisa da Igreja de Hannover. Reunidos em Augsburgo, na Alemanha, em uma etapa preparatória inclusive alusiva aos festejos do jubileu da Reforma em 2017, 120 teólogos e teólogas discutiram sobre perspectivas e caminhos para a transformação da Igreja atual. Buscava-se responder o que significa ser luterano no século XXI. O que significa ser cristão no século XXI também deveria ser a preocupação de todos nós hoje, independentemente da denominação.
Naqueles primórdios da Reforma Protestante do século XVI, o radicalismo foi uma das características de parte do movimento, o qual será visto no próximo fascículo. Naqueles primórdios da Reforma Protestante do século XVI, o radicalismo foi uma das características de parte do movimento, o qual será visto no próximo fascículo. 

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