Eduardo VI, o filho varão tão ansiado por seu pai Henrique VIII como sucessor no trono, reinou na Inglaterra de 1547 a 1553: tinha 15 anos ao morrer. Antes da morte, o rei-adolescente deixara testamento para que fosse sucedido por sua prima Jane Grey, por receio de que a reforma da Igreja Anglicana fosse por água abaixo. Sobre Jane Grey e seu destino, o “Livro dos Mártires” de John Foxe afirma: “Seu reinado durou somente cinco dias, porque Maria, conseguindo a coroa por meio de falsas promessas, empreendeu rapidamente a execução de suas expressas intenções de extirpar e queimar a cada protestante. Foi coroada em Westminster da maneira usual, e sua ascensão foi o sinal para o início da sangrenta perseguição que teve lugar". Maria Tudor, que a sucedeu, passou para a história com o apelido de “Sanguinária” (Blood Mary), pois em seu reinado, cerca de 300 protestantes foram executados e 800 fugiram para o continente europeu. Entre os 800 que fugiram, havia um homem chamado John Knox.
Quem foi John Knox? Nascido nas Ilhas Britânicas, talvez na Escócia, com dados biográficos pouco conhecidos, Knox foi ordenado sacerdote em 1540, tendo mais tarde abandonado o catolicismo pelo protestantismo. Foi escravo em navios na França por cerca de ano e meio, sendo libertado e tendo ido para a Inglaterra durante o curto reinado de Eduardo VI. Com a subida ao trono de Maria e a perseguição religiosa acontecida, fugiu para a França em 1554, indo posteriormente para Genebra. Discípulo de Calvino, ele voltou a seu país natal entre 1559 e 1560, numa época quando os calvinistas assumiram o controle de Edimburgo. Knox desenvolveu artigos de fé que foram aceitos pelo parlamento na Escócia, abolindo-se assim o Catolicismo Romano. Em 1560, reuniu-se a primeira assembleia geral da Igreja Presbiteriana escocesa, que elaborou o Livro de Disciplina, o qual foi inicialmente rejeitado pelo Parlamento. Apesar das dificuldades, John Knox reuniu condições para implantar, com apoio político, um novo modelo de Igreja calvinista, que acabou por se constituir no Presbiterianismo.
Com a morte de Knox, outro ex-exilado em Genebra chamado Andrew Melville (1545-1622) deu sequência ao seu trabalho, tornando-se o principal defensor do sistema presbiteriano e de uma igreja independente do estado. Nos reinados seguintes, continuaram as imposições do anglicanismo e as perseguições aos presbiterianos e, finalmente em 1689, o presbiterianismo foi estabelecido definitivamente na Escócia. Em 1970, a Igreja Presbiteriana da Escócia tinha mais de um milhão de membros. Na Inglaterra, a Igreja Presbiteriana foi criada em 1876 e contava com 60 mil membros em 1970. Na Irlanda, com um presbitério inicial fundado em Ulster em 1642, após restrições políticas, econômicas e religiosas impostas pelo governo inglês, em 1970, a Igreja Presbiteriana da Irlanda tinha cerca de 140 mil membros. A partir de 1715, os “escoceses-irlandeses” começaram a sua grande mudança para os Estados Unidos.
Para o movimento presbiteriano em geral, a Assembléia de Westminster é de suma importância, já que foi realizada na Inglaterra em um período histórico no qual o presbiterianismo prevalecia, com condições de ser implantado em todo o país, fato que acabou não se efetivando. Durante muitos anos, os puritanos vinham insistindo para que a Igreja da Inglaterra tivesse uma forma de governo, doutrinas e culto mais puros. Foi então convocada a Assembleia, reunida na Abadia de Westminster, em Londres, a partir de 1643, com a presença de 121 teólogos, ministros da Igreja da Inglaterra (quase todos calvinistas), além de membros da Casa dos Comuns e da Casa dos Lordes. Quanto à forma de governo, a maioria era a favor do presbiterianismo, havendo ainda um grupo desejando a forma congregacional e alguns a episcopal. Durante cinco anos e meio, houve mais de mil reuniões do plenário e centenas de reuniões de comissões e subcomissões.
De acordo com Alderi Souza de Matos, “a Assembléia de Westminster caracterizou-se não somente pela erudição teológica, mas por uma profunda espiritualidade; gastava-se muito tempo em oração e tudo era feito em um espírito de reverência”. Foram elaborados pela Assembleia os seguintes “Padrões Presbiterianos”:
• Diretório do Culto Público, que substituiu o Livro de Oração Comum, além do Saltério, versão métrica dos Salmos para uso no culto
• Forma presbiteriana de governo eclesiástico, em lugar da episcopal com bispos e arcebispos
• Confissão de Fé
• Catecismo Maior e Breve Catecismo
Na Escócia, a Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana adotou os Padrões de Westminster logo que foram aprovados, deixando de lado os seus próprios documentos de doutrina, liturgia e governo que vinham da época de John Knox. Da Escócia, esses padrões foram levados para outras partes do mundo.
Nos Estados Unidos, o calvinismo chegou com os puritanos ingleses que se radicaram em Massachusetts no início do século XVII. Na Nova Inglaterra, porém, houve a opção pelo governo congregacional da igreja, não pelo sistema presbiteriano. Outros calvinistas de origem holandesa, francesa e alemã também imigraram para a América, porém foram os escoceses-irlandeses os principais responsáveis pela introdução do presbiterianismo naquele país. Durante o século XVIII, cerca de 300 mil cruzaram o Atlântico, estabelecendo-se principalmente em Nova Jersey, Pensilvânia, Maryland, Virgínia e nas Carolinas. No oeste da Pensilvânia, foi fundada Pittsburgh, a cidade mais presbiteriana dos Estados Unidos. Ashbel G. Simonton, o primeiro missionário presbiteriano no Brasil, era descendente desses escoceses-irlandeses da Pensilvânia.
Os presbiterianos participaram ativamente da vida nos Estados Unidos, estando presentes em muitos episódios históricos, como a guerra da independência. Em 1800, a Igreja Presbiteriana contava com 180 pastores, 450 igrejas e cerca de 20 mil membros. Divisões aconteceram ao longo da história, incluindo-se aquela que também ocorreu em outras denominações por causa da escravidão, causa que separou o Norte do Sul. Tanto a Igreja Presbiteriana do Norte quanto a do Sul enviaram muitos missionários a todo o mundo, inclusive ao Brasil.
Quanto às doutrinas, os presbiterianos tradicionalmente mantêm dois sacramentos: o batismo e a Ceia do Senhor (ou Comunhão). No batismo, tanto de adultos quanto de crianças, usa-se a aspersão ou a afusão; entendem que crianças devam ser batizadas, tal como se circuncidavam crianças no Velho Testamento para mostrar que eram parte da comunidade judaica. Na Ceia do Senhor, creem que Cristo está presente no pão e no vinho através do Espírito Santo.
Presbiterianismo é um dos ramos do Calvinismo, uma das quatro alas iniciais da Reforma Protestante. Os batistas surgiram cerca de meio século depois, também como decorrência da uma das alas, assunto a ser abordado no próximo fascículo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário